segunda-feira, 29 de abril de 2013

Bater a porta e sair

Edward Hopper - Nighthawks (1942)

Dentro de sua mente, ainda podia ouvir o som da porta ao bater daquela última vez. Daquele canto da sala de onde lhe parecera nunca mais sair, nada lhe era mais presente. Havia uma mudança lenta dos tons da parede à medida que o Sol era filtrado pelas cortinas claras, e as horas iam passando ao longo do dia. Cada detalhe daquele arranjo de flores sobre a mesa de centro fora cuidadosamente analisado sob aquele inusitado ângulo de observação no qual se encontrava agora.

Em certo instante, dentro de um looping eterno, entre o sorridente início de tudo e os fatos descontrolados que os levaram até o momento da contagem das hastes de margaridas sobre a mesinha de centro, houve a consciência que já se passavam pelo menos 12 horas que não pronunciava palavra. Nem consigo, muito menos com ninguém. Pensara isso ao olhar a xícara de café, ainda pela metade, sobre a mesma mesa de centro e que esfriara tanto tempo atrás – Percebeu seus lábios secos, colados, sedentos de saliva que os tirasse da prisão do silêncio. Parecia que daquela vez em diante nunca mais haveria diálogo, aparentemente, mesmo os monólogos haviam sido encerrados.

Noite. Súbito, levantou-se. Cuidou minimamente da aparência de cansaço. Lançou-se à rua. Minutos depois trocava ideias sobre a vida com o simpático senhor que atendia no antigo Café da esquina, do amargor da frustração à insistência que algo maravilhoso pode estar sempre pra acontecer. Passavam os anos e seu José continuava infalível em acompanhar histórias dos outros. Alguns cafés e pães de queijo depois – mal se dera conta o quanto estava com fome - aquela seria sua vez de bater a porta e sair pra vida.

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