segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Anódino


Alexander Rodchenko, Girl with a Leica 1934 (fonte: aqui)

Quis escrever um conto pra ti, para descrever a última vez que te vi. Deveria ter sido como uma daquelas cenas da Nouvelle Vague, longe de tão incrível por não dispor da liberdade da câmera para escolher os enquadramentos, como também pelo argumento. Mais simples, a cena teria planos banais de uma cidade em qualquer momento mais inexpressivo, cinza, corroído, cansado.
Neste cenário anódino, quando não havia mais amor, a direção de arte falhava em tudo, a fotografia se perdia sem propósito, sem diálogo com o expectador. Assim, você estava muda, o olhar vazio para o celular. Destaque apenas para o blasé da vida que seguia, pontuado pela sua forma de tocar a ponta dos cabelos, o pigarro da boca seca, o incomodo, a pressa de ir embora.
Os anos lhe fizeram bem, devo admitir sem nenhuma reserva. Seu silêncio até o momento de partir, a confirmação que em meio a tantos tropeços ainda era possível ver alguma arte em tudo isso.  


2 comentários:

  1. Adoro esses seus vislumbres que viram contos tão bonitos! Muita, muita arte aqui.

    Abraços, Dave!

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  2. Olá Larissa,

    Sua visitas visitas e comentários sempre me alegram! E sim, há arte na mesma medida que ela me escapa, os vislumbres são isso mesmo, arte em si, aquela que não consigo por no papel (pelo menos como mereceria).

    Abração e bom domingo!

    Dave.

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