segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Do lado em que quebram as ondas

Henri Cartier-Bresson
Um dia ela saiu. Juntou suas coisas pra ver outra vida, conhecer um oceano distante, ver de perto as ondas que quebravam em outra direção, numa praia que vira num cartão postal quando era pequena. Aquele momento não careceu despedida, nem havia muito que levar, comprou uma passagem de ocasião.  O mais importante era por os pés na areia daquele outro lado do mundo, no lado B de si mesma, quando suas saudades caberiam nos versos de um guardanapo, no sabor ácido daquele limão na bebida, no flerte do jovem que tomava uma cerveja no bar. Num final de tarde estava ali, do outro lado do mundo, no lugar onde os ventos faziam curvas que reviravam seus cabelos cacheados ainda mais, e ela pensava que aquele horizonte era do tamanho de todos os sonhos que podia ter vivido quando ainda não sabia que a dor obrigava a deixar coisas pra trás. A aceitar que o cenário mais belo do cartão postal é feito de alguma matéria de coisas que não existem mais. Nesse momento quis escrever algo, telefonar, quem sabe, tirar a foto perfeita. Não precisava dizer mais nada. Como não mais se veriam tudo seguiria seu rumo, de agora em diante só bastava ver as ondas que quebravam de um jeito diferente do outro lado do mundo.
Distância é uma precária combinação de pontes que insistem em se manter inexistentes, mesmo com todos os aviões cruzando os céus. 

Ps: O outro lado de si mesmo é a fronteira final. Há quem diga que poucos chegam lá. Ninguém nunca conseguiu voltar.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

ANTES QUE ELA CHEGASSE


Almoçara cedo nesta sexta feira, praticamente não tocou na comida. Ainda havia coisas para arrumar na casa antes que ela chegasse, mais ainda para colocar em ordem em sua cabeça antes que a visse novamente. Urgia dar uma aparência decente ao apartamento, dar um jeito na pilha de pratos na cozinha, papéis sobre o sofá, na roupa usada largada pelos cantos. 

Fez o que podia, pois sua vontade era pouca, forte apenas para uma luta imaginária contra o relógio, faltavam agora poucos instantes para a hora marcada. Do que era preciso mesmo para aquele encontro estava quase tudo pronto. 

O interfone tocou pontual, sabia que era ela, liberou imediatamente o portão. No momento em que chegou a sala estava ainda da mesma forma, não conseguira organizar nada, estava tudo do jeito de sua cabeça. Trocaram um “olá” rápido, pra dentro, intenso na dissolução da expectativa de que, de alguma forma, fosse diferente naquele último encontro. 

Sim, era talvez o último, ela estava se despedindo sem dizer nenhum “adeus”. Perguntou sobre suas coisas. Ele respondeu que estavam todas lá, encostadas na parede, nas últimas malas. Ele ajudou a descê-las do segundo andar. Do outro lado da rua um sedã escuro com os vidros levantados a esperava com o motor ligado. 

Ele faltou ao trabalho essa tarde. Com voz embargada, disse ao Chefe que estava doente.