Acordou subitamente no meio da madrugada. Estava
bastante suada. Oitavo andar, mesmo com a janela aberta, não havia sinal de
brisa que aliviasse o forte calor de verão. Tudo estava iluminado, o luar
invadia o quarto. Estava sozinha, havia muito tempo que não dividia sua vida
com alguém. Acostumara-se à solidão, se dava conta disso agora, pois não tinha
a quem contar o sonho estranho que acabara de ter.
Mas esse não era o problema, nem mesmo seus estranhos
sonhos recorrentes. Sua Vida, essa sim o era, iniciada dessa forma, com letra maiúscula
e intensidade, pois naquele instante, por alguns segundos nos quais recobrava
fôlego, ofegante, não sabia mais o que era real. Demorou até que seu pulso
voltasse ao normal, tinha fortes dores na coluna. Tomou um comprimido e olhou o
vazio da rua pela janela.
Lembrava-se do sonho agora, via seu amor indo
embora, atravessando a rua, levando suas coisas. Arrependeu-se, tentou
impedi-lo, pulou a janela e conseguiu voar. Seu feito atraiu a atenção de todos
os passantes, que voltaram o olhar para cima. Uma mulher gritou. Ele parou no
meio da faixa de pedestres e olhou para trás. Foi atropelado e morto por um
ônibus circular.
Hoje, depois de tanto tempo, tem duvidas se as
coisas aconteceram de fato dessa maneira.
Tiraria a prova, essa noite pularia a janela outra
vez.
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