quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Um Outro Conto Sobre Leia (em memória de Carrie Fisher 1956-2016)

Leia e Han

Havia tempo que se prometiam um reencontro, assim, despretensioso, apenas os dois. Como se fosse possível esconder algo deles mesmos e só falar sobre a vida. Depois de tanta correria, tantos desencontros e distância, umas cervejas naquele bar onde se viram pela primeira vez seria o ideal. Ideia dela, sempre dela, mas, porque não?

Ela surgiu mais linda do que nunca, havia cortado os cabelos, nunca a vira assim. “O tempo, e o pilates foram generosos”. Disse para ele em meio a um sorriso confidente.

A conversa alegre e fluída do início da noite foi sucedida por uma intensa euforia   intercalada por alguns silêncios nos quais olhavam para os lados, para os copos de cerveja, para as telas inertes dos celulares, menos nos olhos um do outro.

Já se encaminhavam para o momento que certamente falariam sobre eles e o real significado de estarem ali, quando ele, sempre ele, mudou o rumo de tudo para comentar sobre a inesperada morte de Carrie Fisher naquele dia. Fã de Star Wars, confessou que Princesa Leia tinha sido sua primeira musa do cinema, ainda na infância lá na década de 1970, algo que, pelo tempo que ela o conhecia, claro, já sabia. Ela lembrou que no início ainda sentiu uma ponta de ciúmes, mas depois passou a ver com ternura aquela paixonite atávica de criança que ele (ainda) trazia.

Chegou a hora de se despedirem. Sabiam ambos que aquela janela seria única, não mais teriam oportunidade assim de se verem. Já na rua, antes dela entrar no táxi eles se abraçaram. Já sob evidente efeito das cervejas, ele disse para ela que ela havia sido sua própria Leia Organa. Ela respondeu que sabia, pois para ela ele sempre seria de alguma forma o seu Han Solo. Porém, como na continuação da saga, também não ficariam juntos para sempre.


Ela lhe deu um beijo perto da boca e partiu. 

Leia se fora. Duas vezes em um mesmo dia. 

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Sonhos ao Café (conto)


Quase todos os dias, ao café, ele contava seus sonhos. Ela os ouvia, um tanto a contragosto,  mas meio curiosa.

Os dela porém, raros. Quase nunca os falava. Ficava em silêncio, não sabia serem imagens do seu futuro, ou de seu passado, que voltavam a lhe afligir como presente. Ou simplesmente, esquecimento.

Essas conversas terminavam quase sempre com os dois mudos. Seus olhares atravessando o inalcançável de cada um, esbarrando na parede branca por trás.

Um dia, devagar as mãos de ambos cruzaram a mesa, se tocaram, entrelaçaram os dedos de leve.

O toque delicado disse a eles tudo sobre o futuro.


quinta-feira, 10 de novembro de 2016

terça-feira, 1 de novembro de 2016

domingo, 16 de outubro de 2016

Pequeno Conto de Partida


Ainda podia vê-la em todos os cantos, impressa nas paredes, no angustiante ato de reconhecer familiaridades nas voltas que fazia a fumaça do cigarro. Também podia ouvi-la como ainda estivesse ali, andando pela casa, mesmo que fosse apenas o eco distante da batida da porta quando partiu.

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

The Red Drum Getaway

Quando Hitchcock encontra os vilões de Kubrick.


The Red Drum Getaway from Gump on Vimeo.

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

sábado, 23 de julho de 2016

quinta-feira, 7 de julho de 2016

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Navidad (reedição)

Reedição de um poema em prosa publicado aqui em 03 de julho de 2012.
Editei os parágrafos e alterei algumas palavras, como também, convidei a sedutora solitude de Edward Hooper para ilustrá-lo.
Espero que gostem.


Edward Hopper

Dentro de algum sonho esquecido, em um apartamento ao qual nunca mais voltaria, no fundo de uma grande gaveta na sala havia uma caixa de pequenas e intricadas coisas de fazer rir. Um trancelim de barbantes de graça, uma caixa diáfana de cócegas fáceis, um silêncio antes da risada e uma infinidade de pequeninos versos por serem escritos.

Como o vento essas coisas se foram para se tornarem outras, e se juntarem a sabores, fotos e lugares imprevistos, visitados com delicadeza em dias de sol, sem que ninguém soubesse. Praias desertas, outros sorrisos, colo e carinhos. 

Ao Sol a vida pode voltar a correr como a areia daquela praia secreta. Uma forma de espera, um aconchego, para poder contar uma nova grande novidade. 

Porém, o tempo nunca está a favor. 

terça-feira, 21 de junho de 2016

sábado, 4 de junho de 2016

Muhammad Ali (1942 - 2016)

A Lenda


Homenagem do blog ao gigante dos ringues e sua luta por um mundo menos injusto.
Em seu legado, além da poética de seu movimentos e da potência de seus golpes, nos deixa a precisão de suas palavras e atos contra o racismo, a desigualdade e a intolerância.
De lutadores assim o mundo precisa.




sábado, 28 de maio de 2016

segunda-feira, 9 de maio de 2016

domingo, 8 de maio de 2016

Keith Mansfield - Exclusive Blend (1969)




Uma Carta que Não Foi (conto)



Parei esse dia para te escrever uma carta, uma dessas em que não cabe falar de amor. Tenho estado parado todos esses dias, justo porque teu amor me faltou. Olhar insistentemente para o telefone não é solução. Escrever, muito menos.

Ainda não sei se a enviarei, se terminá-la talvez não sobreviva ao meu próximo suspiro, ou ao engasgo de uma fala que meus amigos já não aguentam mais ouvir. Nem eu.

Não sei se teu cheiro, a lembrança de minhas mãos entre tuas pernas, ou das janelas do carro embaçadas numa rua qualquer onde nada parecia fazer mais sentido do que a entrega desesperada dos lados escondidos de nossos corpos. Tudo que me faz as mãos suarem enquanto escrevo.

Já vai muito tempo desde então. Nesse tempo quis te colocar num conto e você queria me ver sumir.

Enfim, ambos escapamos, que triste. Só para continuar a viver. Entrar na fila do próximo filme. Ter mais uma resenha para começar a escrever e nunca terminar.

Nesta carta que ainda não sei se te entregarei, gostaria mesmo de não ter que escrever nada. Apenas desenhar tuas pernas abertas como vi pela primeira vez, mas num arranjo no qual pudesse expor a mágica dos teus pelos, e dos tons e cheiros que nunca me deixaram.

Não sei desenhar tão bem, nem minha memória anda tão boa.

Essa carta não seguirá.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

A Canção (conto)

Robert Doisneau, Le Muguet du Métro, 1953
Fim de tarde e seu ônibus parou em um sinal no retorno do trabalho. Pela janela viu um casal jovem, enamorado, sentados abraçados num banco de praça. 

Pensou numa canção que falava da paixão e seus riscos: encontros, desencontros e perdas. A mesma que cantarolou muito tempo atrás, depois que um grande relacionamento seu tinha acabado. Ela o fez em um momento quase sem intenção, como uma música de fundo que só ela podia reconhecer, para um amante fugaz, assim também, em um banco de praça. 

Se lembrava que este reconheceu a música de pronto e completou o verso, que na verdade, falava unicamente dela. 

Terminaram ainda naquela semana. Não houve nenhum sobressalto. Guardou esse momento para si, como também essa canção. 

Nunca mais a cantou para ninguém.

domingo, 1 de maio de 2016

terça-feira, 12 de abril de 2016

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Orvalho Sobre Flores de Pedra

Lisette Model On Fifth Avenue. New York City. 1940s

Andou pelas ruas do Centro como há muito não o fazia. O movimento rude de antigamente lhe fazia bem, cheiro de diesel, suor. Sons do trânsito e as cores dos velhos prédios que apenas intuía, pois, envolta em seu particular daltonismo.

Há tempos que nos levam para longe, para o lugar onde o esquecimento é máxima lembrança inscrita na pele, como no relance do sonho logo depois de acordar, a imagem da pracinha do bairro, nas horas mortas das tardes de domingo – nada menos distante, nada mais vazio.

O castigo da lembrança se esvaia pelo movimento, sabia disso. Por isso naquele dia desceu de seu prédio, abandonou seu carro, faltou o trabalho e andou até lhe doerem os pés. Não tinha porquês na caminhada, não havia nenhuma meta, e aquela avenida extensa lhe servia muito bem, a impressão que não haveria fim lhe era conveniente.

Encostou-se numa sombra de marquise, pediu um cigarro a um estranho. Riu de uma piada sem graça. Tragou lentamente, quase se esquecera porque parara de fumar, quase já não lembrava porque mudara tanto.

Definitivamente, algo lhe dizia para não seguir.

Não continuou.

No dia seguinte partiu para ser ela mesma. No final, as dores de amor se esvaem pelo caminho, pensou. 

Como orvalho sobre flores de pedra, em poemas dos outros.

segunda-feira, 14 de março de 2016

domingo, 13 de março de 2016

segunda-feira, 7 de março de 2016

sexta-feira, 4 de março de 2016

As Marcas Daquele Lugar (conto)

Richard Tuschman: Woman Reading 

Ela precisava alugar um lugar para aproveitar a breve licença que conseguira na Universidade para concluir seu artigo. Conseguira um apartamento mobiliado no estado vizinho. Não tão distante que não fosse possível voltar rápido de carro caso necessário, nem tão próximo que a colocasse ao alcance das inevitáveis interrupções, sobretudo, familiares. O tempo era curto. Tudo deveria ser intenso e rápido. O texto deveria sair dessa vez de qualquer jeito.

Poucas malas no carro, tomou a estrada muito cedo. Chegou quase pontualmente às dez horas, os poucos minutos de atraso se deveram a algumas voltas que teve dar a mais depois que perdera um acesso na entrada da cidade. Sempre acontecia, se perdia de uma forma ou de outra, odiava dirigir ali. Bairro de classe média alta, ruas limpas e bem pavimentadas, arborizado. Teria a paz que precisava para o trabalho.

A dona do apartamento a recebeu com euforia, achou ser um traço dela, um condicionamento pela frequência com a qual recebia inquilinos temporários. Talvez tivesse uns 65 anos, não mais do que isso. Apesar da voz acelerada, como quisesse sair dali o mais rápido, mostrou em detalhes o que era fundamental para a operacionalidade do lugar. Durante o briefing, pôde perceber pelos livros na estante do gabinete de trabalho que ela era de uma área de pesquisa pela qual também se interessara quando estava no doutorado um tempo atrás. Muito provavelmente, professora de alguma universidade. Tentou puxar conversa sobre isso, sugeriu conhece-la de algum lugar, pois parecia-lhe familiar, talvez até, que ela conhecesse seus orientadores de mestrado e doutorado. Em vão, o máximo que conseguiu foi assentimento da mesma sobre a coincidência de interesses, apesar das óbvias referências que o lugar sugeria.

Em torno de poucos minutos tudo estava concluído. Depois que se instalou começou a se dar conta que apartamento além de completamente mobiliado, ainda contava com toda decoração sobre as estantes, mesa de centro da sala, nos quartos, fotos dos filhos nos porta-retratos, jarros com plantas na varanda, roupa de cama, mesa e banho, apetrechos de cozinha. Tudo parecia lá como se os moradores estivesse todos no cômodo ao lado, ou, tivessem saído para visitar alguém e logo retornassem.

Ela não conseguiu não pensar como o tempo parecia ter parado ali, pensou isso com certa aflição, pois parecia-lhe estar em uma cápsula do tempo: o estilo construtivo e os materiais caros dos anos 80, os móveis projetados em cerejeira, piso de madeira corrida marrom, luminárias. Tudo parecia gasto, mas com discrição, o gasto pelo tempo, inevitável, ainda assim, com uma conservação admirável. O fato que lhe incomodava, apesar das evidências de presença, era um lugar vazio, quase um museu. Ninguém saiu apenas para que o imóvel fosse alugado. Todo lugar era organizado para preservar a memória dos anos, como se as pessoas das fotos nos porta-retratos continuassem a viver ali.

Com o silêncio do lugar e da vizinhança, em uma pausa para um café na primeira tarde passou em revista sobre os títulos nas estantes do escritório, material de trabalho em aula e de pesquisa, claro que ela era professora. A questão era, seria aposentada? A pergunta surgiu quando reparou nas caixas de arquivo que datavam de seis anos, com xerox de textos utilizados em algumas disciplinas. Todos os livros tinham edição desse último ano limite, bem como, as revistas científicas ou revistas periódicas jornalísticas sob a mesa de centro na sala. Algo acontecera que mudou tudo ali, não apenas, o fato de mudar-se para outro lugar e dispor deste para aluguel, mas o tempo havia sido deliberadamente aprisionado. Parecia que nada deveria sair dali, além do que, contra tudo que pudesse fazer a época, tivesse partido.

No dia seguinte, após o café da manhã percebeu mais evidências do grande ponto de mudança na vida dessa mulher. Além das fotos dos filhos, quando crianças e já adultos se graduando no ensino superior, e suas mesmo em viagem por lugares distantes, não havia, além de nenhuma referência ao presente destes, também, não havia sinal do pai e, ou, marido. Ele não estava em lugar nenhum. Nas paredes da sala e do corredor, haviam marcas que denunciavam a existência de quadros ou fotos naqueles lugares durante muito tempo e que foram retirados depois. Como cicatrizes do tempo, as paredes traziam esmaecidas, as marcas da pintura produzidas por anos em que foram cobertas pelos quadros que já não estavam mais lá.

Nos dias que se seguiram dedicou-se ao trabalho a que se propusera. Só encontrou novamente com a proprietária no final do período combinado para devolver-lhe as chaves. Novamente deu-se a conversa simpática com toques de euforia (quase) contida. Claro, não comentou nada com ela sobre suas questões e hipóteses sobre os sinais (evidências?) que o ambiente suscitava. Mais tarde já estrada, aliviada pela sensação de dever cumprido pela conclusão do trabalho, pensou que a mensagem contida no apartamento fosse ele mesmo, daquela forma, sem legendas, sem explicações. Fechado para qualquer tipo de arqueologia afetiva que resultasse em algum mínimo sucesso.

No final a verdade estava ali para ser compartilhada por pessoas como ela, estranhos, que sempre recusariam a perceber o óbvio, que o apartamento era o corpo do tempo marcado pelas partes que faltavam, um apelo para dividir o sentido do peso dos anos.


E de todas as coisas sobre as quais não vale mais a pena falar. Nem esquecer.

Ann Peebles - Trouble Heartaches & Sadness

Ann Peebles

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Homenagem a David Bowie (1947-2016)


Hoje pela manhã fiquei sabendo da morte de David Bowie.

Não consegui conter as lágrimas.

Conheci tardiamente seu trabalho, mas depois, de alguma maneira ele se tornou muito íntimo. Suas músicas passaram a fazer parte de momentos importantes, como trilha sonora, cada vez com mais sentido, a medida que o tempo passava.

Era uma espécie de amigo distante de olhos coloridos que compartilhava um devaneio pelas coisas do espaço. De alguma forma sua música e atitudes traduziram para mim parte desse universo.

Livre, voltou algum lugar além desta galáxia. Nada parecia mais com ele do que o espaço. Dia 08 de janeiro lançou seu último disco e comemorou seus 69 anos. Dia 09 foi o dia do Astronauta. No dia seguinte partiu Major Tom, ou, melhor, Ziggy Stardust, para as estrelas, talvez estivesse dando a pista de seu rumo em Blackstar, seu último trabalho. 

De qualquer forma, ele estava sempre à frente, sempre soube mais do que nós.



Boa viagem, Starman.








quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Paper Tiger - Lost and Found


Trip hop e downtempo com um belo vocal. Vale a pena conferir o álbum: Paper Tiger (YouTube)