Cartier Bresson |
Sob pouca luz, parada à porta do quarto seu corpo adquiria
um tamanho muito superior ao que tinha de fato. E que já era muito. Nesse
momento ela o inquiria com os olhos sobre o seu silêncio. Suas distâncias não
casavam com os olhos profundos que lhe perscrutavam a alma de cordeiro sob a
pele de lobo. Ela sabia. O perigo nunca foi ele, o risco era estar ali, o risco
era viver, ela ama o risco. Alguém já tinha dito, há muito em jogo quando o
jogo é se entregar. Entregas dissovem lobos em cordeiros e transforma
escuridões em lugares aprazíveis, e depois de tudo, tudo ao contrário. Naquela
noite em particular, não queria se apaixonar, apesar de amá-lo. Queria
ignorá-lo ali, daquela distância infinita enquanto não andava em sua direção. O
que havia ali, o que mudara? As antigas certezas foram deixadas pra trás depois
de algumas garrafas de vinho, o macht point daquele momento não tinha nada a
ver com vida depois, era apenas o momento, fechar o set. Repetia pra si, o
velho mantra que ensinava a ele a cada encontro: por que não? Ele não a ouvia.
Tolo, não sabia ver. Ouvir pra quem relutava tanto já era luxo. Luzes off. Depois
da penumbra, sob a luz que escapava das persianas fechadas, a sombra longilínea, dizia do
espaço que se fora, distâncias nunca mais seriam necessárias, pois inúteis.
Dobrá-lo não fora difícil, como também não o fora convencê-lo que voltaria. Ao
sair disse-lhe com voz terna: tudo tem seu tempo. E fechou a porta devagar. Ela
sabia algo de tempo e distâncias, disso ele tinha plena certeza. Depois de
algum tempo que não conseguiu mais vê-la, dedicou-se a escrever as várias possibilidades
de reconstruir com palavras os cheiros e o sabor de sua boca.
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