"DAVE BOWMAN: You see, something's going to happen. You must leave. HEYWOOD FLOYD: What? What's going to happen? DAVE BOWMAN: Something wonderful" (2010: The Year We Make Contact)
terça-feira, 8 de dezembro de 2015
quinta-feira, 12 de novembro de 2015
quarta-feira, 11 de novembro de 2015
Para Futuras Histórias (conto)
Paul Almasy - Dancers |
Não parecia tão tarde da noite, mas naquele momento a música já havia parado. Ela não sabia se sentia-se tonta pelo excesso de vodka, ou pelas voltas que deram lembrando antigas músicas da época em que se conheceram, mas via flashes de luzes coloridas quando fechava os olhos: vermelhas, brancas, amarelas.
Abriu os olhos, mas não
conseguiu olhar para ele. Em um canto longe de todos, envoltos pelo silêncio, cada frase
solta, cada pergunta desencontrada parecia mexer cada nervo do corpo. As
falas e respostas dele a relaxavam e, ao mesmo tempo, a colocavam em um
estado de alerta total. O perigo estava ali, no abrigo, no afago, no lugar em
que estava, em sua teimosia poética de insistir em perder-se. No calor daquele abraço.
Seu coração já estava envelhecido,
foi prematuro. O dele pulsava, pronto para tomar o Álamo, mas todos sabemos, este
não caiu. De olhos bem abertos, sabiam, não falariam de amor. Ela não seria
devorada por si mesma novamente e ele recolheria seus mortos.
Desta noite guardariam apenas
o silêncio como mote para futuras histórias.
segunda-feira, 2 de novembro de 2015
quarta-feira, 28 de outubro de 2015
The Brian Jonestown Massacre - Wisdom
"My love
Is
Like a flower
Daisies
Are
Always free"
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The Brian Jonestown Massacre
Tudo Que Conseguia Lembrar (conto)
Hugues Erre |
No dia no qual que ela se sentiu
mais só, todas as verdades que trazia consigo no peito se esvaiam em lágrimas
discretas. No final da tarde, tentou voltar para casa e não conseguiu. Depois
de alguns momentos de hesitação na portaria de seu prédio, seguiu adiante.
Passou em frente a padaria, depois ao posto de gasolina, deteve-se na
floricultura, onde lhe ofereceram algumas margaridas. Declinou da oferta. Um
breve e forçado sorriso e continuou. Ao passar em frente a livraria quis tomar
um café, mas sabia que não o faria sem um cigarro, mais um, foram tantos durante
essa tarde. Melhor não. Quatro quadras a frente o bar estava abrindo. Foi a
primeira cliente, mesa de frente para porta, primeira bebida e direito de
escolher a primeira música do dia.
Algum tempo e várias doses depois, ao
decidir voltar para casa encontrou a luz da cozinha acesa e uma carta sobre a
mesa. Ele não voltaria. Despiu-se, deu comida ao gato que faminto entrelaçava-se
às suas pernas, pegou uma cerveja e afundou-se no sofá. Tentou lembrar de todas
as formas o que dera errado, mas só conseguia lembrar de quando vira o sorriso
dele pela primeira vez e de quando tudo parecia para sempre, até aquele
momento, em que seu gato já andando sobre seu peito, lhe reclamava um afago.
sexta-feira, 23 de outubro de 2015
quinta-feira, 15 de outubro de 2015
O Maior Presente
Queria dar-lhe um
presente inesquecível. Pensava há tempos em ficar ali para sempre. Quem sabe
marcada na pele dele, indelével, em alto relevo, sensível ao toque. O mesmo toque,
que fazia as costas dela arrepiarem sempre.
Mas não hoje. Queria algo
para ele lembrar quando ela partisse, quando fizesse silêncio, estivesse alegre
ou triste. Não encontrou nada em nenhuma loja que chegasse perto de dizer o que
sentia.
Deixou-lhe de presente um
silêncio sem fim, arrematado com um beijo, do tamanho do amor que ela não podia
mais carregar consigo.
segunda-feira, 5 de outubro de 2015
quinta-feira, 1 de outubro de 2015
domingo, 27 de setembro de 2015
quinta-feira, 24 de setembro de 2015
Mergulho (conto)
Letargia. Perdera a hora
e o trabalho hoje. Sabe-se lá mais o que perdera.
Cedo, derrubou o despertador no chão. As pilhas
rolaram para os lados. Os olhos semicerrados viam o caminho para a toalete, mas
essa não era a saída. Aliás, não sabia mais por onde seguir.
O celular tocou insistentemente, primeiro seu namorado. Logo depois, do trabalho. Não atendeu nenhum e o desligou.
Manhã alta, a
fresta de luz da janela lhe incomodava, apenas isso importava. Cobriu a cabeça
com o travesseiro, mergulhou no meio da cama.
Nunca mais se teve notícias dela.
Ollano - Latitudes (Air Remix)
Helena Noguerra (vocal) |
Versão bacana de Latitudes feita pelo Air. Irresistível voz de Helena Noguerra. A performance original pode ser conferida aqui: Ollano - Latitudes
quarta-feira, 23 de setembro de 2015
sábado, 22 de agosto de 2015
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
Volta
Não dormira essa noite,
caminhou desde a madrugada por muitas ruas. Depois de tanto sentou-se numa mesa
de canto em um bar perto da estação central. Desses que tem um ar úmido, acre de
tempo desperdiçado, azedo e sem razões. O lugar para tomar uma cerveja que
ninguém espera estar gelada – e nunca está. A longa e estreita porta para rua, mal
iluminava o salão. Nos fundos, ao lado do balcão, já na penumbra um corredor
estreito seguia para os quartos que serviam de motel. Pensava em como matara suas
crenças tempos atrás, todas, inclusive as de afeto. Não fora sempre assim, mas
a juventude era uma lembrança bastante gasta, dessas que não valia a pena
tentar remontar. Viu alguns casais que ora ou outra entravam e saiam. Estava
velho para aventuras, a única coisa que dá alguma razão para vida. Entendia a
todos que permaneciam vivos de fato. A cerveja quente naquele bar fedido
confirmava que estava fora do jogo. Mais tarde voltaria para seu caminho. Definitivamente,
havia sido uma péssima ideia ter voltado para vê-la.
segunda-feira, 3 de agosto de 2015
Sem Respostas
1944, outono. Ela não
tinha notícias de seu jovem marido há meses. Tempos de guerra, não havia
respostas para as cartas, restavam as horas, a solidão, a esperança. Mas
nenhuma notícia. Casaram-se pouco antes da convocação dele, cerimonia coletiva,
terno e vestido emprestados. Lua de Mel no pequeno sótão, que por três dias chamaram
de lar. Levava os dias da fábrica, operadora de torno. Tempo que se arrastava, pois envolto no vazio dessa distância. Escrevera
mais uma vez para ele há pouco, contara que estava agora no sétimo mês de
gravidez. Na cama, sob a pouca luz do quarto acariciava lentamente a barriga,
via seus seios fartos e pensava na nova vida a caminho. Em breve não mais
estaria só. Seriam dois sobreviventes, haveria muita coisa a fazer. Era
preciso mais amor, apesar de tudo. Sentiu-se mais bonita e mais forte do que nunca.
Disse tudo isso para ele na carta que acabara de selar. Sabia que as chances de
respostas eram cada vez menores. Ou nenhuma.
sexta-feira, 10 de julho de 2015
quinta-feira, 9 de julho de 2015
Aniversário a Flor da Pele
Muito
mais do que o normal, estava tomada em euforia. Sua pele estava sensível, havia
um formigamento ao toque, sentia graça nas formas dos objetos, ao seguir curvas
e linhas, sentir o quente e o frio, o áspero e o suave. Seus ouvidos conseguiam
ouvir músicas que não conhecera antes, assim, pelos cantos casa. Havia um
perfume novo em suas narinas, tão apaixonante que juraria ter cor. Seus olhos
brilharam com a luz filtrada pela cortina, parecia mágica. Tudo era como sábado,
tinha torpor e nenhum limite em querer, queria o que não sabia ainda querer.
Queria a vida diferente e pronto, não precisava de nenhuma resposta. Apenas
lhes serviam os sinais de encantamento que as belezas mais impossíveis lhe
mostravam. Vestiu seu vestido de todas as cores, ainda que quase nada vestisse.
Foi para rua abraçar o desconhecido, pois era dia de aniversário.
quarta-feira, 8 de julho de 2015
sexta-feira, 3 de julho de 2015
Nada Fica
Edward Hopper |
Meu bem,
Tenho trabalhado tanto e
tanto não tenho feito nada. Pena, nunca consegui encontrar as pílulas de ascese
do Dr. Weber. Parece que todos que conhecia as tomaram, estão sumidas do
mercado. Tudo melhora às sextas, há o gosto de café e a noite, cerveja. Segunda
a labuta tem um gosto de passado, não há como respirar o passado, parece com os
sonhos sobre a Escola. Nunca são bons. Já basta a dor de cabeça ao acordar.
Lembrei que você falava sobre o futuro. Agora nenhum dos meus amigos mais fala
sobre o futuro, provavelmente por estar muito próximo, bem ali, poucos anos. Sem
prorrogação. Preferem falar dos filhos.
Há pouco tempo pra todos nós. Nada
fica.
Quisera um carnaval como
nunca tive na vida.
E não ter que levantar na quarta-feira.
Sinceramente
segunda-feira, 29 de junho de 2015
segunda-feira, 15 de junho de 2015
Cheiro de Mar (conto)
Ele aceitou o convite dela
naquela tarde para se verem. Nada demais. Talvez um chopp, mais um papo sobre as
poucas coisas que sabiam da vida um do outro. Já se conheciam há um tempo. Não
iam muito além de alguns limites interditos nas perguntas sobre as vidas
intimas de cada um, já sabiam o que precisavam saber desde a primeira vez que
se viram. Claro, já tinham ficado antes, duas, três vezes, não lembravam ao
certo. Não parecia mais ser o caso lembrar. Naquela tarde ele a pegou no
trabalho. Ambos deram um jeito de sair mais cedo. Para sua surpresa ela pediu
para ir a uma praia distante, não para o discreto café que sempre iam. O
percurso de quase uma hora ficou marcado pelo delicioso perfume dela. Harmonizava
com os movimentos das mãos, enquanto gesticulava para explicar-lhe algum ponto
de vista com veemência, quando sequer ele sonhava em discordar dela. Parou o
carro na areia. Pés no chão. Andaram vários minutos enquanto ela lhe falava de
mudanças, decisões e inseguranças. Ele só podia ouvi-la, não havia nada que
pudesse fazer ou dizer diante de tudo. Ela sabia, mas fazê-lo ouvir-lhe de
alguma forma lhe dava alguma segurança. Quase noite, entraram no mar. Lá ela
disse para ele que estava indo embora. Se beijaram com a certeza de ser a última
vez. Ela também estava se despedindo dele. No dia seguinte em seu carro ficaram, além de toda a areia, o cheiro de mar e o perfume dela que nunca mais o
deixariam.
domingo, 14 de junho de 2015
terça-feira, 26 de maio de 2015
Por um Triz
Rachael |
Essa semana quis escrever
algo para você. Por pouco não te liguei. Por um triz não mandei uma mensagem. Dias
depois só podia ver pernas, suor, as costas que não as suas. Quer saber, meu bem? Lembrei
de suas pernas e de seu inconfundível cheiro agridoce misturado com perfume,
quase disse seu nome por engano algumas vezes, pensei ter passado disso. Ontem tomei uma
cerveja interminável em sua causa. Na volta a pé, alta madrugada, parei frente
a um prédio que imaginei ser o seu, absurdamente bêbado, toquei o interfone e
fugi de forma desembestada. Tropecei num meio fio perto da esquina e abri a
testa. Impressionante como você ainda faz meu sangue jorrar. Ao longe jurava ouvir
sua risada.
sábado, 23 de maio de 2015
terça-feira, 19 de maio de 2015
A Casa dos Azulejos Amarelos (conto)
Meu bem, ontem te vi em
meu sonho. Incrível como tudo parece tão real quando tu apareces. Ao mesmo
tempo, tudo é diferente. Dizem que não sonhamos com cores, mas sempre te sonhei
colorido. Dessa vez te vi numa casa de azulejos amarelos. Fascinante como os sonhos
nos pregam peças. Na infância havia uma casa de azulejos amarelos na minha rua,
tinha uma varanda ampla com uma garagem cuja entrada tinha um arco suave apoiado
nas extremidades por meia-colunas em espiral, ao lado da varanda uma ampla
janela com cortinas brancas. Me mudei dessa vizinhança muito cedo e não tive chance de entrar nessa casa, sequer cheguei a conhecer seus moradores. Mas nunca a
esqueci, embora não me lembre de ter parado em algum momento da vida para lembrá-la.
Até agora. Nessa sua nova casa do sonho você me abria os braços, o sorriso e
através da cortina branca eu podia ver a rua e um céu azul profundo e intenso, justamente
na hora mágica. O mais estranho do sonho, meu bem, é que ao me virar novamente, não lhe via mais. Parecia nunca ter estado lá. E a casa amarela era apenas
a casa da minha infância, e, voltando apressada para a janela, pude ver a
mim mesma quando criança, olhando na direção da janela na qual estava.
domingo, 10 de maio de 2015
sábado, 9 de maio de 2015
Um Segredo
"Vestiram suas roupas devagar" |
Vestiram suas roupas
devagar, de vez em quando ela olhava para ele sorrateiramente, de forma moleca,
de um jeito que só essa noite ela o fizera. Ele não tirava os olhos dela, não
conseguiria nem que tentasse. O banal da vida que se desenrolava parecia ganhar contornos surreais, nenhum cataclismo
anunciado, um desvairo apenas. O maior deles, o definitivo e o mais passageiro.
Ela tinha aquele jeito jovial, o seu sorriso o desarmava de toda sua seriedade,
os movimentos dela tinham uma graça que o fazia pensar estar em um filme
qualquer que vira há muito tempo, um o qual não lembrava o nome. Olhando
aquelas ancas, suas tattoos e a marca esmaecida do biquíni, claro que não
lembraria de filme nenhum. Sobretudo enquanto ela sussurrava o nome dele soprando
leve dentro da orelha e seus pelos arrepiavam. Sem pressa dirigiram-se para a porta.
Mesmo sabendo quase nada um do outro, agora dividiam um segredo que dissolvia
as grades da jaula que prendia a vida.
segunda-feira, 27 de abril de 2015
Cadafalso? (Conto)
Jeanloup Sieff - Femme nue couchée sur un lit(1969). Fonte: AQUI |
Somente agora ela
percebeu que o tempo passou. Naquela atribulada semana conseguiu parar um tempo
em casa e ouvir seus silêncios. Eles gritavam coisas do passado, os segredos
dela, o tudo mais que aprendera a organizar diligentemente junto com a vida para
resolver. Iria casar-se em breve. Em meio à sua confusão interior apenas um murmúrio
clamava para que pensasse mais sobre tudo. Estava demasiadamente
ansiosa para admitir para si mesma a questão: “se tratava de uma solução ou de um
cadafalso? ”. Apesar do sorriso convincente que trazia nos últimos meses, suas
pequenas mudanças interiores já somavam o volume de uma grande barragem,
prestes a explodir. Deixou-se cair na cama no meio da tarde, tinha um suor frio
e abundante, coração acelerado. Com a intensidade de quem estava perto do fim excitou-se
como se fosse a última vez. Com a respiração ofegante, por alguns segundos se
viu livre, além de tudo que sempre acreditou ser a felicidade. Gritou para
dentro sua agonia, as palavras que nunca seriam ditas para ele.
sexta-feira, 10 de abril de 2015
Encontros e Desencontros (Lost in Translation) X Ela (Her)
No final, tudo se resume a Ela. |
Pesquei aqui:Cinema de Buteco
Lost in Translation // Her: An Unloved Story from Jorge Luengo Ruiz on Vimeo.
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Encontros e Desencontros (Lost in Translation)
segunda-feira, 6 de abril de 2015
sábado, 4 de abril de 2015
segunda-feira, 23 de março de 2015
Um Tipo de Adeus (conto)
Atribuído a Thomas Eakins (fonte: Les Yeux Clos) |
No dia em que ela se
despediu o fez como quem não quisesse ir. Na verdade não sabia que aquele
sorriso que ensaiou para ele, beirando o mais natural que podia, seria sua
última imagem. No fundo sabia sobre o que tudo significava. O fim é
irreversível, seus gatos sentiam, o mundo agora ganhava outra forma, fluida, numa
arquitetura sem ponto de fuga. E sua casa já não era um porto seguro. Aquele
era seu momento definitivo, a partir do qual tudo mais seriam lembranças, e os
sonhos, presságios apenas da manhã na qual não estaria. Sorriu no vídeo que
deixou para ele antes de partir. Aquele sorriso dela seria para ele sua forma de dizer eternidade.
Em memória de minha mãe.
domingo, 22 de março de 2015
terça-feira, 17 de março de 2015
Entre os Dedos II (conto)
Edward Hopper - Room in New York (1932) |
Os últimos dias foram os
mais difíceis para eles até ali. Os silêncios e as tentativas de gestos de boa
vontade se esvaziavam no ar. Se ainda havia amor entre eles, já não parecia
estar em nenhum lugar daquela sala de estar, nem nas plantas, nem nas
fotografias sobre a prateleira, nem além da janela. O desespero de verem-se sem
opções, tempo ou paciência tornou-se lágrimas que vinham em qualquer lugar. No
colo dele, ela ainda tentou retrucar o imponderável, quis dizer “mas eu te amo”.
Não teve forças. Nunca disse. Nunca dirá.
domingo, 15 de março de 2015
Entre os Dedos (conto)
Na noite anterior nenhum dos
dois dormira em casa. Se viram apenas pela manhã, dia alto, enquanto tomavam um
café na cozinha. A maquiagem pesada dela ainda marcava os olhos, as olheiras
dele denunciavam a bebedeira que ainda não passara. Havia um silêncio pesado
entre eles, nos últimos dias chegaram ao ponto mais profundo que podiam ao
tentar atingir um ao outro. Não conseguiam mais entender como chegaram até ali,
como os verdes anos de paixão, que pareciam tão próximos, caíram tão rápido no
esquecimento. Ela sussurrou: “o que nós fizemos com a gente?”. Seguiu-se uma
longa respiração. Pausa. Se abraçaram de uma forma que não se deixassem mais
ir. Não bastou. Escaparam-se entre os próprios dedos, como o tempo que não
conseguiram ver passando. Ao final do mês colocaram o apartamento à venda.
quinta-feira, 12 de março de 2015
segunda-feira, 9 de março de 2015
sexta-feira, 6 de março de 2015
Se Vestiu de Sábado (conto)
Fonte: Zabava |
No dia que finalmente o esqueceu não se deu conta disso. Foi à rua de vestido floral, pernas ao vento. Nesse dia também não usava sutiã, também esquecera que um dia quisera muito por silicone nos seios, “não muito, mas pelo menos um pouco para não precisar usar sutiã com enchimento”, pensava. No dia que o esqueceu também não precisou mais lembrar, seja por nostalgia, desejo ou raiva de nenhum dos belos rapazes com quem deitou-se nos últimos tempos. Todas as promessas de amor instantâneas. Todas as farras e ressacas que a traziam para a mesma terra de ninguém da lembrança. No dia em que tudo isso acabou ela andava pela rua com o sorriso mais lindo e magnético que nenhuma mulher jamais teve. Seus cabelos refletiam o sol em uma cor nunca vista. Os meninos pararam o jogo de bola para ver suas costas nuas. Os homens deixaram o bar e se perderam no movimento de sua bunda rua abaixo. No dia que ela o esqueceu lembrou-se como era se vestir de sábado.
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015
Uma Forma de Partida
René Groebli (via: Violadreamlover) |
Daquela vez não pensou. Seu cansaço era a medida de sua impaciência. E de
seu desejo. Cansara de se interrogar porque explicava tanto sobre ele. Cansou
de ouvir de si mesma por que precisava de tantas palavras. Essa noite ele não estava. Ela
também não, não mais. Se sentiu mais bonita do que nunca ao toque daquele recém chegado. Apenas as roupas dela pelo chão lembrariam em algum momento
quem fora. Talvez ela retorne ao que era pela manhã. Talvez não.
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015
terça-feira, 10 de fevereiro de 2015
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015
Ela Queria Mais
Morning Sun (Edward Hopper, 1952) |
Sua mudança estava
completa, uma nova cidade, uma nova vida. Neste novo lugar nem mesmo ela
se reconhecia. Ou talvez agora se conhecesse mais do que nunca. Sentia sua pele
acesa, vibrante como todo o resto do seu corpo. Ao passar as mãos sobre as
pernas, nuca, seios sentia-os ardentes, como espetados por milhares de minúsculos
alfinetes que lhe lembravam a cada segundo que tinha pressa, um desejo furioso,
uma fome de algo que estava lhe retesando os músculos, criando um permanente
sorriso nervoso, incontrolável. Havia voltado pra casa há pouco, do cara que conheceu
ontem trazia o pescoço marcado pelo arranhar da barba malfeita e um cheiro de
perfume masculino barato. Na beirada de sua cama via as primeiras luzes do Sol.
Toca-se excitando-se se como a vida dependesse da continuidade eterna desse
entorpecimento. Ela podia tudo. Rufaram os tambores de guerra. Ela queria mais.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015
sábado, 31 de janeiro de 2015
E Se Devoraram
Arthur Leipzig - Subway Lovers (New York, 1949) |
Naquela
noite dançaram livres como da primeira vez que pensaram na possibilidade de ter
um ao outro. A cada volta, seus rodopios os levavam além do limite já quase nulo que
havia entre eles. Em meio ao tempo acelerado pela tequila chegaram ao
ponto onde sabiam, teriam suas vidas postas ao avesso por eles mesmos. O
cheiro do suor dela, a nota amadeirada do perfume dele. Em uma frase perdida,
sussurrada, ela tentou articular um sentido qualquer pra tudo que sentia. Queria um atalho, um precipício, uma justificativa para lançar-se para dentro dele, para mais profundo naquilo que a queimava por dentro, que a fazia querer suas entranhas. Uma mordiscada de leve na ponta da orelha dela. Não
precisavam dizer nada. Quase em silêncio se devoraram.
sexta-feira, 30 de janeiro de 2015
terça-feira, 20 de janeiro de 2015
quinta-feira, 15 de janeiro de 2015
quarta-feira, 14 de janeiro de 2015
Último Encontro
Brassaï, 1932 |
Depois de algumas recusas ela aceitou revê-lo. Ele fora insistente durante as últimas semanas. Havia um tipo de angústia na voz dele, com o tempo as coisas pareciam piorar. Muito provavelmente pelos bons momentos, ela aquiesceu. Encontraram-se no mesmo café no qual se viram pela primeira vez. O lugar também fora o mesmo no qual romperam, ele insistia no poder das referências. Conversa elíptica. Ela odiava. Ele sabia estar perdendo suas últimas fichas. Ela pediu um expresso e um licor de cacau, ele apenas um carioca. Ela fumou um cigarro enquanto pairava o silêncio sobre a mesa. Não olhava para ele. Ao final ele pediu um abraço. Rasgava-lhe as entranhas o desejo de pedir-lhe um beijo. Precisava sentir aquele hálito novamente, morder mais uma vez aqueles lábios fartos que sem nenhuma cerimônia se despediam. Não pediu, manteve o último fio de dignidade. Abraçou-a forte. Blasé, ela já não estava mais ali.
sexta-feira, 9 de janeiro de 2015
Às Voltas Com o Silêncio
Anna Karina. (Vivre Sa Vie. Goddard, 1962) |
Ela pediu uma vodka.
Ele, uma cerveja. Longa pausa, demora infinita da garçonete. Seus olhares
afiados cortavam quando pousados mais do que uns segundos sobre os do outro. Na pressa
de dizer algo e preencher o espaço que inexoravelmente os ligava,
esgotaram todas as rotas de escape. Veio a vodka. A long neck ele bebeu no
gargalo, pequenos goles, sempre mergulhado nos olhos escuros dela, sorriso
besta. Ela acendeu um cigarro apenas para brincar com a fumaça que ganhava o ar. Terminaram
a noite abraçados em meio ao silêncio que os denunciava.
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quarta-feira, 7 de janeiro de 2015
Banho Turco (conto)
Four Girls in Shower (Ellen von Unwerth, 1994). Via: violadreamlover |
Sonhou que estava em um banho
turco. O lugar estava repleto de belas mulheres. Louras, morenas, negras.
Algumas mais magras outras com curvas mais generosas, todas lindas. Andavam pra
lá e pra cá nuas ou enroladas em mini-toalhas com as quais o ato de cobrir-se,
ora os peitos, ora a pélvis, parecia inútil. No fundo do salão, sentada em um
banco de mármore amarelo estava sua musa. Surpreendentemente estava vestida
(nota: musas não seriam musas se não arredias). Usava um vestido preto curto que
deixava suas pernas à mostra. O indefectível batom vermelho intenso. Os longos
cabelos escuros cobriam um dos olhos. Mesmo a distância o olhar dela o
paralisou, isso sempre acontecia. Quis sair da piscina em sua direção.
Dizer-lhe qualquer coisa. Tocar-lhe, sentir seu cheiro. Antes que ele terminasse de
pensar ela levantou-se, virou-se em direção a saída. Novamente, sumiu em meio ao
vapor. Ele tentou segui-la. Em vão.
terça-feira, 6 de janeiro de 2015
Nicolas Jaar - Mi Mujer
Si has visto a mi mujer
¿Has visto mi mujer?
Por la calle
Y allá
¿Dónde está mi mujer?
En la calle
Por acá
Por allá
Por allá y por allá
¿Has visto mi mujer?”
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sexta-feira, 2 de janeiro de 2015
Estou Bem, Meu Bem
Haunt me - © April-lea Hutchinson. Via: tanyadakin |
Nos últimos meses ela
esperou por notícias dele. Ainda esperou porque no canto de sua boca resistia
um pouco do sorriso daqueles dias. Ainda fazia-lhe bem lembrar, apesar das
horas congeladas, pousadas sobre a sala de estar. Era final de ano, a medida do
inesperado liberou seu sorriso para além novamente. Bem depois do mais distante
destino de onde poderia vir um cartão postal extraviado. Não contou a ninguém
como conheceu seu novo amor. Na resposta à mensagem de feliz ano novo de seu ex,
não mais que um “estou bem, meu bem. Estou namorando”. Durante o verão daquele
ano seguiu experimentando-se nas artes de surpreender-se. Estava adorando tudo,
às vezes quase sentia falta das músicas que aprendeu a gostar com o antigo amor.
Quase.
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